quinta-feira, 13 de maio de 2010

Sobre os Vampiros de Curitiba

Parte XI

O Invasor

Muriel dormia profundamente, então Vevila e Audra decidiram não perturbar o repouso da irmã e saíram sozinhas para caçar. O fiel cocheiro, membro da Teia, deixou suas amas próximas da igreja matriz e seguiu para o lugar pré-determinado, onde as aguardaria para retornar ao casarão da família nas primeiras horas da madrugada. Por uma questão de descrição, a família Blasco mantinha diferentes carruagens e costumava variar as rotas de fuga durante as noites de caçada.

As mulheres, trajando roupas de viúva e véus que lhes cobriam a face, desceram uma suave ladeira de braços dados, lentamente e com as costas arqueadas para endossar o disfarce. Seus olhos vasculhavam a rua, na busca da presa ideal, quando um rapaz foi arremessado para fora de um bar, logo à frente das duas, quase as acertando em cheio. Lá dentro do recinto, um bando de homens fardados embebedava-se atentos a um rapagão, que teatralmente vangloriava-se por seus feitos em campo de batalha. O mesmo que arremessara seu companheiro de armas para fora por ter pisado em suas botas impecavelmente reluzentes.

As irmãs entreolharam-se - nem precisaram tratar em palavras que o valentão daria um banquete bastante satisfatório. Em uma mesa próxima, as irmãs ouviram um grupo de rapazes comentando da partida logo cedo para Paranaguá, de onde seguiriam por embarcação ao Rio de Janeiro.

Audra e Vevila lamentaram apenas por não estar em companhia de Muriel, que naquele momento entraria despretensiosamente no bar solicitando um copo de água para suas tias idosas, fisgando a atenção de todos, principalmente do macho alfa, que inevitavelmente se ofereceria para escoltar as damas em segurança pelas ruas escuras da cidade, facilitando muito o trabalho das predadoras.

Vevila adiantou-se entrando no bar, seguida pela gêmea, com ares de desespero solicitou o socorro dos bravos e honrados soldados, para recuperar sua bolsa que havia sido surrupiada por um larápio, ali mesmo nas imediações. A suposta bolsa conteria uma generosa quantia de dinheiro que ela dividiria com quem a ajudasse.
Após uma ligeira descrição do marginal fictício os soldados, animados com a recompensa, dispersaram-se pela rua, rapidamente embrenhando-se em vielas e terrenos baldios das proximidades. Audra e Vevila saíram dali também, no encalço de um soldado que observaram afastando-se dos demais algumas quadras rua abaixo – não se tratava do valentão, mas oferecia maior facilidade para a captura.

Acontece que seguindo seu caminho ladeira abaixo, as irmãs observaram a porta de uma casa se abrindo em uma rua adjacente. Uma sombra esguia e imponente permaneceu parada sob o marco da porta, na escuridão, aparentemente analisando a agitação na rua. O homem trancou sua casa, passou pela portinhola rente à calçada e sumiu na escuridão da viela, caminhando em direção oposta à das irmãs. Uma forte rajada de vento frio passou por ele, quase arrancando seu chapéu, e carregou até as irmãs um importante sinal olfativo. As duas ouriçaram-se - como poderia haver outro vampiro em Curitiba? Sem seu conhecimento e consentimento? Isso era péssimo para os interesses da família Blasco.

As gêmeas reconheceram a residência de onde o sujeito saiu como sendo de propriedade da família. Verificaram que naquele momento não havia ninguém que pudesse observá-las e entraram no quintal de Dragomir. Deram a volta na casa e acessaram uma passagem secreta por baixo do assoalho. Começaram a vasculhar a casa para recolher o máximo de informações disponíveis sobre aquele forasteiro. Perceberam que pelos objetos que possuía, não era tão recém chegado à Curitiba quanto imaginavam. Na gaveta do criado mudo acharam uma caderneta com capa de couro. Em páginas marcadas havia uma lista de endereços de imóveis, que as irmãs reconheceram como sendo propriedades dos Blasco, e pior, propriedades por onde a Teia já havia passado com seus túneis. Em outra página, acharam um esboço de mapa, onde os tais imóveis estavam sinalizados por asteriscos em vermelho. Linhas rabiscadas traçavam retas entre esses pontos, aparentemente buscando atribuir algum significado àquela disposição das edificações.

Estava explícito nas anotações que os imóveis haviam sido escolhidos por apresentar o odor vampírico, que para o olfato dos mortais é imperceptível. As irmãs deduziram que o forasteiro ainda desconhecia os túneis, pois além de não serem mencionados na caderneta, também não haviam sido maculados por ele - disso elas tinham certeza.
Audra e Vevila nem se deram ao trabalho de devolver os objetos aos seus lugares. Sabiam que o vampiro inevitavelmente tomaria conhecimento da invasão à sua casa e que, agora, era uma questão de tempo para que o desconhecido chegasse até sua família.

Então, antes de abandonarem a casa, as vampiras espalharam seu odor por todos os cômodos e arrombaram a porta dos fundos, no intuito de continuar dissimulando seus caminhos subterrâneos.

Pularam alguns muros de quintais e caminharam várias quadras para não deixar rastros que pudessem conduzir o intruso aos túneis, pelo menos não antes de definirem a maneira correta de lidar com aquele imprevisto.

Chegaram desconcertadas à carruagem, até ali não haviam percebido que sua refeição tinha sido negligenciada. A sede só as deixou ainda mais irritadas com o insolente, que inadvertidamente causara todo aquele distúrbio.

3 comentários:

  1. A trama está ficando complexa! A teia está se fechando em volta de Dragomir! Está fabuloso isso man! Fico só imaginando as imagens e atmosferas que você relata de maneira estupenda! Gostei deste conceito do odor vampírico.

    ResponderExcluir
  2. Aeee, man!!!
    Fico muito feliz que esteja gostando da história.

    Obrigado pelas palavras!

    Abraço!!!

    ResponderExcluir
  3. bom, man! to seguindo!

    abx

    ResponderExcluir